Poemas em nome próprio
De renomes idos
Sentimentos lidos
Declamações mudas
Janelas de perspectiva infinda
Um diário livre


sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Existem certas manhãs que tornam extremamente possível a extrema e total transformação do mundo. Pode-se escolher voltar a dormir, após o café confortavelmente quente, e aquele dia em verdade jamais terá nascido. Quantos terão morrido ao suspirar com ela?! Quantos?! Mas pode-se também - fortuna despertina - crer-se, como nunca, mais do que desperto. E não importa a bruma imaginária do frescor com que se parte, não importa a vertigem náusea do labor cotidiano, aquela manhã será apenas, e com tal vigor, a primeira manifestação de toda a potência que se(quer) consciente.

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

o deserto do teu beijo

Quando me beijas o pescoço
e me estendo,
eu e meu pescoço prostituto
campo aberto, sequioso,

se me atinges o meu ponto G..emo, amo
e por amar esse momento
desejo que como o deserto,
imagem que por teus beijos vejo,
dure esse real delírio.

Tu nem sabes a que tanto
e tanto me convidas.
Por teu singelo ser
e ser e falar, ao sussurrar,
teu caminhar,
é que às nuvens me atiro.

Serve-me o banquete das delícias
até o instante em que docemente me olhas,
sorriso nos lábios ainda úmidos e quentes.
Entre Deus e o amor,
és meu confessionário.

E na cadência em que o limite do corpo
finge a saciedade da alma,
enquanto o amor alvora
a sesta é em teu colo,
onde repouso.

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

poesia

A poesia é apenas mais uma das verdades
entre as belezas e as desesperanças

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

lua

lua
anunciando a primavera
coração em negro mar
no cais do espaço onde ardo
ancorada ao porto noite
prata flutuante
rosto
astro ao navegar
embora sua
essa presença simples
de surgir por entre estrelas

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

instante poético

É de um só instante necessária a vida
uma só revelação

Não cessa de sentir o corpo
Não cessa de querer o peito

E o desejo é uma chuva fina de cair por dias
murmurosa e macia
uma paz de dor deleitosa
a consciência de saber-se insatisfeito sempre
e amar, ainda e sempre
o inesgotável
o impaciente

Quero o silêncio de seu colo
repleto de um carinho musical
composto sobre o intrumento de meu corpo
etéreo de degelo e fogo
de meu corpo de terra para moldar o amor
infinito, pisado, revivido,
na voracidade de uma voz que me enleve,
quase impossível de se ouvir,
em seu recato indescritível de imensidão e glória.

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

a dança

(a Rogério Claudino)

Quando encolhe seu sorriso
para vitimar-nos bem de dentro.

Quando suspendemos as palavras, poucas
porque nunca delas precisamos muitas.

Nesse seu esparramar de braços,
nesse apresentar de dedos bailarinos,

não é o amigo, o companheiro,
é o artista, o adormecido artista
que nos eleva, desta vida,
ao sonho de, no silêncio, de verdade, ouvi-la.

Como a queremos ou como a sonhamos
em, por um instante,
acreditar que somos deuses.

E nos recebe, nos conduz
no transporte suave desses dedos
aonde sozinhos nunca dançaríamos.

E nos olha dedilhando, nossos olhos
marejados por seus dedos,
dedos que seduzem esse instrumento de amor, o violão
e nos o faz, na baila, amar também.

E é por esse seu amor,
por causa desse seu amor
é que sofremos dessas dores.

Ah!, essas notas que ferem!
Dores de que tanto gostamos,
dores que nos aliviam de dores
das que não gostamos de sofrer.

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

o silêncio

Percebo-o ainda melhor quando o vento sussurra por entre os lábios das folhas, e aí todo ruído é só murmúrio de existência pura. Tive vontade de ouvir uma sonata de Bach, só o cello, um movimento lento. Para mim, música e silêncio são inseparáveis. O silêncio não é a ausência absoluta de sons. O silêncio é antes a ausência de todos os sons indesejados, incongruentes. Quando os elementos se harmonizam, se coadunam, se consonam, existe ainda um silêncio. Uma espécie de silêncio primordial, melodia de uma ordem natural que atrai e conforma amorosamente tudo o que existe. Meus companheiros me deixaram só, no alto da serra, e neste exato momento eu ouço o maior silêncio do mundo. A natureza inteira está agora assentada diante de mim, e não se pode ser feliz sem que se aprenda a amar o próprio silêncio. O sino da igrejinha soou lá embaixo, metálico, distante, invisível, como se um címbalo interior com ele retinisse e me fizesse vibrar por inteiro. E eu tive, talvez pela primeira vez, a sensação de que tudo o que existe e me envolve no espaço de algum modo me acaricia. Realizo a meditação de todas as coisas sumamente vivas. Como quem ouve o silêncio, vejo o vazio animado que me liga a tudo o que posso sentir; ouço o murmúrio de todas as existências tornadas simples por seu volume de presença física e desafio ao vento e às minhas vivências. Como quem renasce, ouço o silêncio de todas as minhas companhias, de todas as coisas tornadas eu na imensidão de uma sensibilidade suavemente acolhida.

Caraça. Catas Altas. 24.10.2004

Bach e o Cello
http://www.youtube.com/watch?v=RxvRKyWsmr8&feature=related

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

pra nascer o sol

Uma grande amiga vem me buscar
para juntos ver o sol nascer.

Desceremos a varanda com o céu já quase azul
ela me oferecendo as mãos e um sorriso.

Vem de longe
e caminharemos até o aconchego dizer: é bem aí.

E nos sentaremos na relva ainda molhada,
amigos de infância esperando o sol,
eu e a manhã.

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

liberdade

Lá fora, um pardal
pássaro sem maiores exuberâncias
voa como se a liberdade lhe fosse ofertada agora.

Enquanto eu, aqui dentro
o mais pequenino dos homens,
com a mais alta das virtudes, sonho.