Das heranças que tive, acho que a maior de todas foi a
esportiva. Poderiam me perguntar sobre aquela dos princípios, do caráter, da
moral... e eu responderia que as tive também. Mas é que, no esporte, todas essas
podem ser reaprendidas, amplificadas, repensadas. Um dia, eu me dirigi assim a
ele: “Pai, quero te agradecer solenemente pela herança esportiva que o senhor
nos deu, a mim e a meu irmão”. E ele chorou ao ouvir isso, imediatamente
comovido e realizado, como homem e como pai. Sempre foi um grande atleta, em vários
esportes. Conquistou mais troféus e medalhas do que eu e meu irmão juntos. Isso
aconteceu há uns dois anos e volta e meia ele me recorda o dito, por querer
reviver. Chorou por que sabe, melhor do que ninguém, a gratidão do
reconhecimento e o significado preciso, concreto e incalculável, que o esporte
proporciona a uma vida.
Há muitos
tipos de alegria, e muitas delas semelhantes. Há muitos tipos de alegrias, e muitas
delas inconfundíveis. A do esporte é uma destas. Experimenta-se, por exemplo, no
amor, na paixão, alegrias que não podem ser comparadas – porque nós as sentimos
únicas. E no esporte é também assim. Quem pratica, sabe. Quem acompanhou as
olimpíadas também pôde perceber isso, nos pontos decisivos, nas vitórias apertadas
ou incontestáveis. Só quem vive isso sabe a sensação e a verdade únicas, “incontidas”
em um grito espontâneo de vitória. Mas não
são apenas vitórias. E o esporte pode ensinar também a perder, a lidar com as
frustrações, mas persistir no aprimoramento, a conviver com a dor e a saber,
pacientemente, que ela passa; ensina relutar a desistir, a enfrentar os medos, a
dedicar-se. Proporciona um grande prazer ao corpo e um enorme proveito ao espírito,
o de poder ensinar também a conviver consigo mesmo, a ponto de saber gozar o “estar
sozinho”, nos treinos ou nas renúncias, ou a entregar-se totalmente na
congregação de gentes várias, que ainda podem se tornar amigas.
Escrevo essa
pequena crônica por meu pai e por dois dias seguidos. Ontem, acordei de manhã e
pedalei após ter tido um início chato de manhã. Voltei revigorado, como quem
reacordasse para o dia. Hoje, surfei com pessoas incríveis, que fazem
do esporte um modo muito bonito e generoso de viver.
Nenhum comentário:
Postar um comentário